segunda-feira, 20 de abril de 2015

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Screening nos distúrbios ácido-base

Na minha opinião, junto com quase toda a nefro, distúrbios ácido-base estão entre os temas mais difíceis da medicina. Para piorar, sua importância é tanta que não podemos deixar de entender! Por isso, indo contra a minha força de vontade, resumi as etapas para iniciarmos o screening frente a esses casos! Boa diversão!

è Caso 1

Sr. JPM é um homem de 42 anos que apresenta queixa de fraqueza, anorexia, dor abdominal e vomito. Laboratório mostrou bicarbonato de 6 mEq/L

Assim como em qualquer caso, nós devemos inicialmente supor diagnósticos diferenciais, certo? Nos casos de distúrbios ácido base, qual a melhor forma de fazer isso? Como tudo na vida, para determinarmos um diagnóstico nós temos que percorrer um caminho. Neste caso é o “Caminho ácido-base”. Durante essa “trajetória”, nós vamos fazer 6 paradas!

- 1ª parada (hipótese clínica geral):
                O fundamental em um cenário de distúrbio ácido-base é entender que esse estado é decorrente de alguma condição prévia que o paciente apresentava ou apresenta. Portanto, primeiramente devemos, através da clínica, avaliar o aspecto geral do paciente e supor quais prováveis alterações iremos encontrar nos exames laboratoriais.

- 2ª parada (Checar o pH sanguíneo):
                Após a avaliação clínica, devemos determinar o pH do sangue. Normalmente o pH sanguíneo fica entre 7,35 e 7,45 no entanto, vamos raciocinar com um valor de referência (VR) de 7,4. Sendo assim:

pH > 7,4 indica alcalemia
pH < 7,4 indica acidemia

- 3ª parada (Determinar o distúrbio primário):
                Determinado o pH sanguíneo, é preciso avaliar se a causa primária desse distúrbio é metabólica ou respiratória. Para isso precisamos checar a PaCO2 e o bicarbonato na famosa fórmula responsável pelo tampão do pH:


                De uma forma geral, essa é uma fórmula que se encontra em equilíbrio, ou seja, existe a mesma quantidade de água e dióxido de carbono em relação ao bicarbonato e o H+. E essencialmente essa fórmula deverá se manter em equilíbrio. Caso haja uma mudança na quantidade de alguma dessas substâncias, vai haver um aumento ou diminuição do H+ para que o equilíbrio se mantenha.
                Sendo assim:
Pensando no Bicarbonato (causa metabólica)
·         Com o aumento do Bicarbonato nós teremos maior consumo de H+ e por isso sua diminuição, fazendo com que o pH sanguíneo aumente.
·         A diminuição do Bicarbonato libera mais H+ e isso aumenta sua quantidade no sangue causando uma diminuição do pH sanguíneo.
Pensando na PaCO2 (causa respiratória)
·         O aumento da PaCO2 faz com que a reação vá para a direita elevando o H+ e com isso diminuição do pH.
·         A diminuição da PaCO2 direciona a reação para a esquerda, e com isso reduz a quantidade de H+ elevando o pH.

- 4ª parada (É compensado ou um distúrbio secundário?):
                Qualquer mudança no pH pode acarretar um quadro clínico crítico por isso, nosso organismo busca, através dos sistemas tampões, minimizar essas alterações através de mecanismos compensatórios. Uma das formas é a que nós conhecemos na 3ª parada! Mas então calma aí... se existe uma forma de compensar a causa primária desse distúrbio, como eu vou saber se o paciente se encontra em um distúrbio misto ou compensado?! Felizmente (ou não...) nosso sistema tampão tem um limite, ou seja, se esse limite for ultrapassado é porque a alteração ácido-base está ocorrendo por causa de uma doença, em outras palavras, é um distúrbio misto.
                O “nosso limite” é relacionado à causa primária do distúrbio ácido-base (avaliado na 2ª e 3ª parada) e dependente da quantidade perdida ou aumentada da substância primário. Segue abaixo a tabela com o limite entre compensatório e patológico.   

                Assustador, né?! Não precisa entrar em pânico! Vamos destrinchar alguns pontos aqui... O paciente que apresenta alguma alteração na PaCO2, por exemplo, vai ter uma alteração no HCO3-, seja por um “reflexo” compensatório do organismo ou por algum outro processo patológico. Determinar essa diferença é fundamental no ponto de vista de tratamento por isso, após nós determinarmos a causa primária do distúrbio ácido-base do paciente nós devemos distinguir se há um processo compensatório ou um distúrbio secundário.
                Outro ponto é a respeito da duração dos distúrbios respiratórios. No distúrbio agudo, há uma doença pulmonar de início abrupto ou algum fator que cause hiperventilação insidiosa (psicogênica, crise asmática, TEP e etc.). No distúrbio crônico há um fator que estimula continuamente o centro respiratório (doença do SNC, sepse e insuficiência hepática) ou uma doença crônica do pulmão, como o DPOC.  

- 5ª parada (Calcular o Anion gap plasmático):
Primeiro devemos entender que o termo “acidose metabólica” reflete a quantidade de Cl- ou o excedente de outros ânions, no sangue. Esses outros ânions, que são chamados de Ânion gap plasmático (AGp), são as proteínas plasmáticas (ex.: lactato). Se nós quantificarmos toda a carga positiva (Cátions) e negativa (ânios) e subtrairmos uma da outra, teríamos como resultado ZERO! No entanto, nós não conseguimos dosar o AGp e por isso precisamos estima-lo através de uma fórmula. Valor de referência (VR) do AGp é de 10 mEq/L

AGp = Na+ − (HCO3 + Cl)

Pela formula, nós podemos ter acidose metabólica quando houver:
·         Perda de bicarbonato -> Cl- aumenta a quantidade para manter o VN do AGp, portanto será uma acidose metabólica hiperclorêmica com AGp normal.
·         Acúmulo de outros ânions -> Nesses casos o organismo vai estar com um problema na excreção ou na produção de ânions, causando o seu acúmulo (ex.: lactato, cetoânions e uremia grave), levando a uma acidose metabólica com AGp aumentado.

- 6ª parada (Diagnóstico!):
                Essa provavelmente é a mais difícil... Após 5 paradas, nós devemos juntar tudo e determinar nossos possíveis diagnósticos! Pode não ter sido extenso, mas com certeza é um assunto complexo, por isso a 6ª parada vai ficar pra quarta feira, assim como o desfecho desse nosso caso! Até lá, nós temos 5 paradas e muita coisa para conversar até chegar no final dessa trilha!

REFERÊNCIA: Symptom to Diagnosis an Evidence-Based Guide 2nd Edition 2010

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Até quarta, galera!

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